Lobo-ibérico (Canis lupus signatus)

Atualmente o lobo-ibérico é o maior carnívoro existente em Portugal. Alimenta-se de presas de grande porte e utiliza técnicas de caça sofisticadas para conseguir o seu alimento. Esta subespécie existe apenas na Península Ibérica, estando as suas populações constantemente em perigo, face às atividades humanas.

© Daniel Santos Photography
Lobo-ibérico adulto

Taxonomia
Reino: Animalia
Filo: Chordata
Classe: Mammalia
Ordem: Carnivora
Família: Canidae   
Género: Canis
Espécie: Canis lupus
Subespécie: Canis lupus signatus

Em Portugal ocorre a subespécie Canis lupus signatus, que é endémica da Península Ibérica, o que significa que existe apenas nesta região.

Estatuto de Conservação e Abundância
O Homem foi e ainda é o principal fator de regressão do lobo, estando classificado com o estatuto de conservação “Em Perigo” (EN) em Portugal. No final do século XIX iniciou-se um extermínio generalizado dos cervídeos silvestres, acompanhado com a destruição da vegetação autóctone, principalmente para fins agrícolas e criação de gado, o que resultou naturalmente no desaparecimento dos habitats naturais do lobo e na diminuição da disponibilidade de presas silvestres. Com esta diminuição das suas presas naturais, este grande predador começou a alimentar-se com maior frequência de gado e isso levou a uma maior perseguição direta por parte do Homem.
O número de alcateias deverá variar entre 45 e 54 a norte do rio Douro e entre 6 e 9 a sul do mesmo. No total o número de alcateias deverá estar entre 51 e 63. É estimado existirem entre 220 e 430 animais em Portugal, dos quais cerca de 90% ocorrerão a norte do rio Douro. Assim, a densidade de lobos a norte deste rio varia entre 1,6 a 3,0 indivíduos por 100 km2 e entre 0,5 e 1,3 indivíduos a sul do mesmo, o que é similar às estimativas registadas em Espanha e na Europa.
Estes dados referem-se aos censos realizados entre 2002 e 2003, no entanto, neste momento (janeiro de 2020) está a decorrer uma nova campanha (executada entre 2019 e 2021) que poderá revelar abundâncias e distribuições distintas das disponíveis atualmente.

Portugal


Mundial

Distribuição
O lobo-ibérico é uma subespécie endémica da Península Ibérica, que no século XIX ocupava grande parte do território, mas atualmente encontra-se restrito ao quadrante noroeste. Em Portugal, historicamente, o lobo ocorria praticamente em todo o território continental, mas no início do século XX sofreu uma acentuada redução na sua área de distribuição.
A população portuguesa representa cerca de 15% da área de distribuição ibérica e atualmente corresponde a apenas 20% da distribuição original. Ocorre sobretudo a norte do rio Douro, com núcleos principais nas serras da Peneda-Gerês e Alvão-Padrela e no distrito de Bragança em continuidade com a população do norte de Espanha, no entanto, existe também uma pequena população isolada a sul do rio Douro, que se encontra bastante fragmentada. A população a norte do rio Douro distribui-se desde a Serra d’Arga até ao planalto Mirandês e o seu limite sul é definido pelo elevado grau de humanização, que se estende desde a região de Ponte da Barca, passando pela Serra da Cabreira e Serra do Marão, subindo finalmente até à Serra da Nogueira e depois descendo até à Serra de Bornes e Douro Internacional. A população a sul do rio douro, devido ao número reduzido de indivíduos apresenta uma presença menos regular, mas pode ocorrer desde a as Serras da Freita e Arada até à região de Trancoso e Penedono. Pode ainda ser encontrado ocasionalmente na Serra da Malcata.

Ecologia e Comportamento
Habitat: No nosso país preferem como habitat as zonas montanhosas do Norte e Centro do país, por apresentarem menores densidades populacionais humanas, uma agricultura menos intensiva e pela maior disponibilidade de coberto vegetal. Estas condições dão ao lobo algum refúgio, sendo este um fator especialmente importante durante a época de reprodução. O lobo-ibérico não é especialista em termos de habitat, podendo ocorrer tanto nas zonas mais frias, como nas mais quentes e tanto em zonas de grandes florestas, como em zonas mais abertas (matagais, por exemplo). Este é um animal com uma alta capacidade de adaptação e, por isso, pode ocorrer numa grande variedade de habitats, sendo condicionado principalmente pela disponibilidade de alimento e do grau de pressão humana.
Comportamento: O lobo é um animal social, formando grupos familiares constituídos normalmente por um casal reprodutor, um ou mais adultos ou subadultos e as crias do ano. As alcateias são extremamente dinâmicas e frequentemente desagregam-se e formam múltiplos novos grupos, com uma elevada taxa de renovação de crias. O número de indivíduos de uma alcateia atinge um mínimo antes da época de reprodução, pois alguns animais dispersam, deixando a alcateia e devido à elevada mortalidade durante o primeiro ano de vida dos juvenis, principalmente durante o outono e inverno. Esta tendência para formar alcateias permite ao lobo caçar animais muitas vezes maiores que ele próprio. Em Portugal, dependendo das regiões do país, o número de animais por alcateia varia entre 2 e 8 indivíduos, sendo normalmente máximo depois do nascimento das crias.
A dispersão é mais frequente durante o outono e a primavera e resulta do aumento da competição entre indivíduos devido à falta de alimento ou devido à reprodução. Os lobos dispersantes nem sempre formam novas alcateias e, por vezes, podem viver sozinhos durante algum tempo.

© Daniel Santos Photography
Lobos-ibéricos adultos.

A dimensão dos territórios das alcateias varia consoante o tamanho das mesmas e com a disponibilidade de alimento e não são áreas constantes, podendo também variar com o amento/redução da competição com alcateias vizinhas. Em Portugal, estima-se que as áreas vitais variam entre 65 e 376 km2 a norte do rio Douro e entre os 85 e 145 km2 a sul do mesmo.
O lobo está mais ativo principalmente durante a noite e na Península Ibérica parece ter dois picos de atividade distintos, um durante a primeira metade da noite e outro durante a madrugada. Depende muito da sua audição e olfato, que são extremamente bem apurados, mas a visão também é relativamente boa.
Os lobos são animais com uma resistência física extraordinária e quando caçam podem percorrer longas distâncias, mantendo uma velocidade média de 8 Km/h, mas pontualmente podem atingir uma velocidade máxima entre os 55 e os 70 km/h. Apesar destas características, apenas entre 10 a 49% das suas tentativas de captura são bem-sucedidas e, por isso, pode passar meses com pouco alimento. Depois de caçar, o lobo é capaz consumir até 10 kg de carne por refeição e normalmente come totalmente as presas capturadas.
Predadores e Estratégias de Defesa: Pode chegar aos 16/17 anos em cativeiro e em liberdade normalmente não ultrapassa os 13 anos de idade. A mortalidade é elevada podendo ter várias causas, nomeadamente doenças, competição intraespecífica (entre elementos da mesma espécie), perseguição por parte Homem e falta de alimento. Sendo uma espécie de topo na cadeia alimentar, não apresenta inimigos naturais.
Dieta: O lobo é uma espécie carnívora que é capaz de caçar animais de médio a grande porte, como javalis (Sus scrofa), veados-vermelhos (Cervus elaphus), corsos (Capreolus capreolus), cabra-montês (Capra pyrenaica) e cavalos de montanha (Equus ferus). No entanto, sendo uma espécie generalista, também caça animais de pequeno porte, como roedores e lagomorfos. Quando as presas naturais são abundantes, parece preferir alimentar-se destes animais, mas por outro lado, quando são escassas pode-se alimentar de animais domésticos, embora muitas vezes estes ataques sejam exagerados ou até falsos. O lobo é oportunista, e sabe-se que em algumas regiões de Espanha alimenta-se também de carcaças, de frutos silvestres, insetos e lixo humano.

© Lemuel Silva
Carcaça de um veado-vermelho, morto por lobos-ibéricos.

Morfologia Externa e Identificação
Biometrias: Em tempos o urso-pardo-europeu (Ursus arctos arctos) era o maior carnívoro da fauna portuguesa, no entanto, como consequência da sua extinção em território português, esse estatuto passou a ser do lobo.
A altura ao garrote do lobo-ibérico varia entre os 55 e os 75 cm e o comprimento total médio do corpo é de 150 cm. O peso normalmente varia entre os 20 e os 40 kg, no entanto, os machos mais velhos podem atingir os 50 kg.

© Daniel Santos Photography
Lobo-ibérico adulto.

Adulto: O lobo-ibérico é a subespécie de lobo mais pequena e a que pesa menos em comparação com todas as outras. Assemelha-se a um Pastor Alemão, mas é mais corpulento, com o peito mais largo. O corpo é comprido, assim como os membros, que são estreitos e fortes. A cauda é espessa e permanece quase sempre caída entre os membros posteriores. Apresenta uma cabeça volumosa, alongada e de apeto maciço, com orelhas curtas, triangulares e eretas e focinho largo. Os olhos têm a pupila redonda e são de cor castanho-claro. A cor geral da pelagem varia entre o cinzento-escuro e o castanho-escuro, apesar de existirem registos raros de indivíduos completamente negros ou brancos. Na zona dorsal apresentam tons castanho-amarelados, com uma mancha negra que se estende até à cauda. A zona ventral é, geralmente, branco-amarelada e a garganta e as faces são brancas. Nas patas exibe uma lista negra bem definida, que é mais evidente durante o inverno. A presença de tons avermelhados e/ou amarelados são características particulares desta subespécie. Durante o inverno a pelagem do lobo-ibérico é mais longa e densa do que no verão, especialmente na cauda e no pescoço, formando uma pequena juba, que lhe confere uma maior proteção ao frio, aparentando durante esta altura ser mais corpulento.
O dimorfismo sexual é pouco evidente, mas normalmente os machos são um pouco maiores do que as fêmeas.

© Daniel Santos Photography
Lobo-ibérico adulto.

Juvenil: Os juvenis, em comparação com os adultos, têm normalmente um tom geral mais escuro e menos tons arruivados.
Espécies similares: Não existem espécies similares ao lobo-ibérico na fauna portuguesa.

© Daniel Santos Photography
Lobo-ibérico juvenil.

Indícios de presença: O lobo é uma espécie muito territorial, principalmente durante a época de reprodução e, por isso, deixa frequentemente marcas visuais e odoríferas e faz-se ouvir através dos famosos uivos.
As pegadas são difíceis de distinguir das dos cães de tamanho semelhante, mas as do lobo são mais alongadas, enquanto que as pegadas dos cães são mais arredondadas. São também parecidas com as pegadas da raposa-vermelha (Vulpes vulpes), embora sejam muito maiores. O Lobo tem cinco dedos nas patas anteriores, mas o dedo interno por estar localizado muito alto, não é visível nas pegadas. As patas posteriores têm apenas quatro dedos. As pegadas anteriores dos lobos e dos grandes cães domésticos são maiores do que as pegadas posteriores – medindo cerca de 9 a 11 cm de comprimento e 8 a 10 cm de largura vs 8 cm de comprimento e 7 cm de largura, respetivamente. As almofadas dos dedos de um lobo são mais longas do que as de um cão e os dois dedos do meio são mais abertos. As marcas das garras são também mais fortes, mais longas e mais pontiagudas. No caso do lobo e do cão, se traçar uma linha reta na base das marcas dos dois dedos da frente (do meio), essa linha cruzaria as marcas dos dois dedos dos pés externos. No caso da raposa-vermelha, a linha não cruzará os dedos mais exteriores (ficará entes os 2 dedos mais interiores e os 2 dedos mais exteriores).

Pegadas do lobo, do cão e da raposa. As pegadas nesta imagem não correspondem ao tamanho real. Baseado em Olsen et al. (2013).

O lobo e a raposa-vermelha ao deslocarem-se colocam frequentemente as patas posteriores numa posição próxima à posição das patas anteriores, resultando numa sobreposição de pegadas. Um cão geralmente move-se com o corpo ligeiramente inclinado, ficando as pegadas das patas posteriores um pouco fora da direção das da frente. O lobo desloca-se normalmente em linha reta deixando rastos também em linha reta, enquanto que as pegadas de um cão desviam-se frequentemente para os lados, assim que o animal é distraído por um cheiro. A passada varia entre 20 e 90 cm a caminhar e a correr varia entre 120 e 160 cm.

© Lemuel Silva
Trilho de pegadas de um lobo-ibérico.

© Lemuel Silva
Pegadas de um lobo-ibérico.

O excremento do lobo é do mesmo tamanho que o de um cão e tem uma forma cilíndrica, geralmente de cor cinzento-escuro, com 10 a 15 cm de comprimento e 2,5 a 3 cm de largura, ligeiramente torcido e muitas vezes pontiagudo nas extremidades. Quando come uma presa recém-morta, o excremento pode ser quase preto e macio. É comum conterem restos identificáveis das presas, como por exemplo pelo, enquanto o excremento de um cão não é torcido e não contém restos de animais. O lobo defeca em locais de descanso ou nos limites de seu território e os excrementos podem ser encontrados frequentemente em pedras, tocos e outros locais semelhantes que deem algum destaque.

© Lemuel Silva
Excremento de um lobo-ibérico com pelo de cervídeo.

Podem detetar-se também pelo cheiro a urina e pelas arranhadelas no chão, que são formas de marcar territórios, e ainda por carcaças de animais recentemente mortos. Faz tocas ou aumenta as de outras espécies entre as raízes das árvores, debaixo de rochas ou grutas com cobertura densa.

Reprodução
Os lobos são normalmente monógamos, sendo as alcateias descendentes de um macho e de uma fêmea não aparentados. A época de reprodução compreende-se essencialmente entre março e maio, apesar e haver registos de reprodução fora deste período, e apenas acasalam uma vez por ano. É rara a ocorrência de mais do que uma ninhada por alcateia, uma vez que geralmente apenas o casal dominante se reproduz. A gestação dura entre 60 e 65 dias e depois deste período a fêmea pare em tocas localizadas em áreas com baixa perturbação e com vegetação abundante. O número de crias por ninhada em Portugal varia entre 2 a 11, com uma média de 5. As crias abrem os olhos a partir dos 12 dias de idade e a partir das 3 semanas começam a sair da toca e a interagir com alimentos sólidos. Aos 6 meses, as crias já atingiram praticamente o tamanho dos adultos e abandonam o local de criação, acompanhando o resto da alcateia, altura em que começam a aprender a caçar. A maturidade sexual pode ser atingida aos 10 meses de idade, mas geralmente só se começam a reproduzir depois dos 2 anos de idade. Os juvenis permanecem com os pais durante 10 a 54 meses até dispersarem, embora a idade de dispersão mais comum seja entre os 11 e os 24 meses.

© Daniel Santos Photography
Lobos-ibéricos juvenis.

Notas
O lobo é uma espécie que desde sempre necessitou de muito espaço para sobreviver. Com o aumento da população humana o habitat desde belíssimo animal foi sendo fragmentado e destruído, restando apenas algumas populações em toda a Europa
Muitos mitos ainda persistem sobre o lobo e o confronto com o Homem contínua a deixar cicatrizes, por isso, é o dever de todos nós, amantes da natureza, fazer de tudo para que esta espécie continue a pertencer aos nossos ecossistemas, sendo uma peça fundamental para o seu bom funcionamento. No vídeo seguinte pode ver a importância que o lobo tem em Yellowstone (EUA) e apesar de não ser em Portugal, é um excelente exemplo como a ausência de um predador de topo pode ter um impacte extremamente negativo nos ecossistemas.

Bibliografia
› Bencatel, J., Sabino-Marques, H., Álvares, F., Moura, A.E. e Barbosa, A.M. (eds.), 2019. Atlas de Mamíferos de Portugal, 2ª edição. Universidade de Évora. Portugal. 271 pp.
› Cabral, M.J., Almeida, J., Almeida, P.R., Dellinger, T., Ferrand, A.N., Oliveira, M.E., Palmeirim, J.M., Queirós, A.I., Rogado, L., e Santos-Reis, M. (2005). Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal. (Instituto da Conservação da Natureza, Lisboa).
› Loureiro, F., Pedroso, N.M., Santos, M.J. e Rosalino, L.M. (2012). Um Olhar Sobre os Carnívoros Portugueses. (Carnívora, Lisboa).
› Macdonald, D. e outros. (1993). Guias Fapas, Mamíferos de Portugal e Europa. Fapas
Olsen, L., e Epstein, M. (2013). Tracks and Signs of the Animals and Birds of Britain and Europe. Princeton; Oxford: Princeton University Press.
› Pimenta, V., Barroso, I., Álvares, F., Correia, J., Ferrão da Costa, G., Moreira, L., Nascimento, J., Petrucci-Fonseca, F., Roque, S. e Santos, E. (2005). Situação Populacional do Lobo em Portugal: resultados do Censo Nacional 2002/2003. Relatório Técnico. Instituto da Conservação da Natureza / Grupo Lobo. Lisboa, 158pp + Anexos.
› http://www.iucnredlist.org/

Leave a Comment

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *