Evolução: novas espécies, evidências e importância (Parte II)

No artigo anterior foi dada uma perspetiva histórica de como surgiu a teoria da evolução e como ocorria este processo a partir da seleção natural. Nesta segunda parte é explicado como surgem as novas espécies, enumeradas as evidências a favor da evolução e o porquê da importância em entender os processos evolutivos.

Como se formam novas espécies
Todas as espécies do planeta, quer sejam bactérias, mamíferos, aves, etc., partilham um ancestral comum numa dada altura da história da vida. Por exemplo, o ancestral comum do Homem e do periquito (Fig. 2), que viveu há cerca de 310 milhões de anos, dividiu-se em duas espécies distintas, seguindo cada uma caminhos diferentes. Não sabemos ao certo qual era o aspeto deste animal, mas não estaremos muito longe da verdade se imaginarmos um animal parecido com um lagarto, de corpo espalmado. Quando a espécie se dividiu em duas subpopulações, estas seriam idênticas e podiam reproduzir-se entre si e gerar descendentes férteis. No entanto, estas duas subpopulações não podiam gerar espécies diferentes se os seus indivíduos continuassem a cruzar-se entre si, pois os dois pools de genes acabariam por se misturar, impossibilitando a divergência.

Figura 1 – Árvore filogenética simplificada dos mamíferos, répteis e aves. O ancestral comum do Homem e periquito situa-se no circulo amarelo.

Não se sabe exatamente como esta bifurcação aconteceu, mas podemos dizer com confiança que as duas subpopulações ficaram de alguma forma isoladas reprodutivamente. Este isolamento é conseguido por barreiras geográficas, como, por exemplo, o surgimento de uma montanha que separa duas populações, ou o aparecimento de um rio. Assim, as duas populações tiveram que ficar separadas uma da outra o tempo suficiente para que quando se voltassem a juntar (caso acontecesse), tivessem divergido tanto que já não conseguiriam cruzar-se, ou se o fizessem não gerariam descendência fértil. Podemos questionar: quanto tempo é suficiente para que isto aconteça? Bem, se as populações estiveram sujeitas a pressões seletivas fortes e contrastantes, pode ter sido uma questão de alguns séculos, ou até menos. Por exemplo, uma das populações pode ter passado de carnívora a frugívora porque os frutos seriam o alimento mais abundante e a outra de carnívora a insetívora porque os insetos abundavam. Assim, podemos assumir que o isolamento reprodutor é determinante na formação de novas espécies.
Mesmo que as condições (pressões seletivas) de ambos os lados da barreira sejam idênticas, dois pools de genes da mesma espécie separados geograficamente acabam por divergir um do outro, até deixar de ser possível a reprodução entre os dois. Isto é conseguido pela acumulação aleatória de variações nos dois pools de genes, processo que é conhecido como deriva genética. Neste caso, ao contrário do anterior, a seleção natural não entra em cena de uma forma tão pronunciada, sendo um processo mais lento e menos comum.

Provas a favor da evolução
A evolução é um processo lento e gradual, que geralmente não pode ser presenciado durante o tempo de uma vida humana. Isto fez com que muitas pessoas, na maior parte dos casos encorajadas pela religião, rejeitassem um facto tão real como o heliocentrismo. Porque falo em facto? Diria que já temos provas suficientes para o fazer e, por isso, segue um resumo das evidências que suportam a teoria da evolução por seleção natural:

Paleontologia: o registo fóssil (Fig. 2) mostra informação detalhada ao longo do tempo das mudanças nos seres vivos. O processo evolutivo das baleias é um dos mais bem documentados, havendo registos fósseis de várias fases desse desenvolvimento.

Figura 2 [Foto retirada de: http://www.freeimages.com/photo/1332688] – Exemplar de um peixe fossilizado.

Anatomia comparada: é o estudo da comparação de estruturas (ex. esqueletos) entre espécies diferentes. Ao camparmos a estrutura óssea dos membros anteriores do morcego e do Homem, vemos que existe uma enorme semelhança, embora tenham funções completamente opostas. Apenas a partilha de um ancestral comum entres estas duas espécies explicará esta similaridade.

Biogeografia: é o estudo da distribuição das espécies de acordo com espaço geográfico e com o tempo geológico. Podemos supor que se a evolução for verdadeira deveríamos encontrar grupos de organismos relacionados em regiões geográficas também próximas. Isto é comprovado quando se comparam as distribuições de organismos atuais ou dos que viveram no passado, uma vez que as espécies estão distribuídas pelo planeta Terra segundo um padrão que reflete as suas relações genéticas.

Embriologia comparativa: esta deverá ser a evidência a favor da evolução mais esclarecedora. Ao compararmos um embrião humano, de uma ave e de um peixe podemos ver que ao longo do seu desenvolvimento, principalmente nas fases iniciais, apresentam muitas similaridades que sugerem um ancestral comum.

Bioquímica: os processos bioquímicos que ocorrem dentro das células são incrivelmente parecidos entre todos os seres vivos, mostrando que todos os organismos terrestres têm uma ancestralidade comum.

Biologia molecular: todos os organismos conhecidos até hoje têm como base funcional o DNA. Para além disso, quando se compara sequências genéticas de diferentes espécies, por muito distantes que sejam, encontra-se sempre alguma similaridade entre algumas sequências. Quanto mais aparentadas forem duas espécies mais similaridades vão partilhar no seu código genético, do que com qualquer outra mais afastada.

Datação radiométrica: permite uma medição absoluta da idade de fósseis ou rochas a partir da proporção de isótopos presentes na amostra. Esta técnica permitiu calcular a idade da Terra, cerca de 4,5 mil milhões de anos, idade que mostra ser suficiente para a formação de vida, para a sua evolução e para originar todas as formas de vida atuais (e as que se já existiram). Esta datação precisa permitiu também ver que existe uma sucessão evolutiva nos fósseis: como seria esperado dentro de um certo grupo, o fóssil mais antigo é menos parecido com o mais recente, mas à medida que se analisam fósseis mais recentes as similaridades vão aumentando progressivamente.

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Entender a evolução é importante
Perceber a evolução ajuda a resolver muitos dos problemas que têm impacto na nossa vida, principalmente ao nível da medicina, da conservação da natureza e da agricultura.
Para nos mantermos um passo à frente de muitas das doenças, é necessário perceber os processos evolutivos dessa doença e/ou dos organismos que a causam. Um bom exemplo são as doenças hereditárias em pessoas, em que os investigadores estudam a história evolutiva da doença, de forma a entender como pode ser combatida/controlada.
O entendimento dos processos evolutivos também é crucial na conservação das espécies, uma vez que as condições ambientais e, por isso, os próprios hábitos dos seres vivos estão em constante mudança. Com as alterações climáticas é importante saber como a distribuição das espécies irá evoluir e como os seus hábitos alimentares se vão modificando. Ignorando a teoria evolutiva poderíamos afirmar que enquanto houver indivíduos reprodutores de uma espécie apenas precisaríamos de alguns para iniciar uma nova população, mas segundo a teoria da evolução a história é outra. Populações muito pequenas enfrentam dois perigos: depressão por endogamia e baixa variabilidade genética, o que pode impossibilitar a recuperação dessa população, apesar dos maiores esforços para a preservar.
Na agricultura tem-se verificado alguns problemas ao longo da história humana. Muitas das pragas evoluem quando expostas a pesticidas, tornando-se resistentes a estes químicos. Por isso, é importante perceber como isto acontece e tentar encontrar alternativas.

Atualmente existem cerca de 8,7 milhões de espécies no nosso planeta e estima-se que 99% de todas as espécies que já existiram estejam extintas. Toda esta variedade foi fruto de um único ancestral comum e foi a partir desta espécie que se formaram todas as adaptações que vemos nos fósseis e nos organismos atuais.
Para aprofundar mais este tema, recomendo vivamente estes dois livros: “A evidência da evolução: Porque é que Darwin tinha razão” de Jerry A. Coyne e “O Espectáculo da Vida. A Prova da Evolução” de Richard Dawkins.

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Referências
Dawkins, R. (2009). O Espectáculo da Vida. A Prova da Evolução. Versão Portuguesa. Casa das Letras
Coyne, J.A. (2012). A Evidência da Evolução. Versão Portuguesa: Porque é que Darwin tinha razão. Tinta da China
http://www.dummies.com/how-to/content/what-evidence-supports-the-theory-of-evolution.html
http://evolution.berkeley.edu/evolibrary/article/medicine_06

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